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Entrevista | George Hemingway “No Brasil, o desafio não é trazer novas ideias, é ter consistência para implementá-las”

10 de agosto de 2017

George Hemingway é consultor e chefe da área de Práticas Inovadoras da Stratalis Consulting e especialista em auxiliar empresas a olharem para o futuro e construírem seu desenvolvimento sustentável

Portal da Mineração: Uma das características das empresas de mineração é serem colaborativas. Pode falar mais sobre isso?
 
George Hemingway: Empresas de mineração são mais colaborativas do que se pensa. Elas se unem para o bem da indústria e estão dispostas a ter conversas com os competidores, pensando em modelos para contribuir. É claro, as empresas competem em negócios específicos: mas, de muitas formas, elas são muito boas em trabalhar juntas e aprimorar de forma geral a estrutura da indústria e como isso se relaciona com o “mundo exterior”. O desafio é a execução, uma vez que o espírito de colaboração existe.
 
Essa energia colaborativa é uma consequência de uma responsabilidade compartilhada: a indústria mineradora enfrenta muitos desafios conjuntos, que não representam vantagem somente para uma empresa, mas para todas as que fazem parte do setor. Além disso, a preocupação com sustentabilidade faz com que haja muito contato com outras empresas e universidades, e essa proximidade não é tão comum assim.
 
PM: O senhor fala sobre três pilares essenciais para o trabalho voltado para inovação: foco, flexibilidade e previsão. Pensando nisso, o senhor acha que a crise que estamos enfrentando poderia ter sido prevista?
GH: Sim, acho que é absolutamente possível. Uma das formas de previsão é entender como as forças se unem em um sistema para mudar as coisas. Você não pode ignorar o fato de que há uma relação entre desafios sociais, agenda política e ações legais.
 
Trata-se de entender os desafios sociais, entender como as forças políticas estão sendo mudadas e partidos políticos estão se movendo por causa desses desafios sociais. A partir daí, você pode entender quais são as potenciais ramificações políticas e até de legislação. Por isso, acredito que a crise poderia ter sido prevista e evitada ou, pelo menos, o país poderia estar pronto para este momento.
 
Você precisa dar dois ou três passos em direção do futuro e entender: “o que este cenário significa para mim para uma companhia?”. Porque significa, sim, alguma coisa. E você pode fazer esse exercício no ramo político, envolvendo países, com commodities. Assim, as empresas vão entendendo como as forças se unem para produzir mudanças, o que as possíveis incertezas representam e como você pode se preparar para os riscos que este cenário traz.
 
PM: O senhor acredita que as empresas estão prontas para serem mais flexíveis e se adaptar melhor a mudanças?
GH: Eu acredito que há uma característica comum entre as empresas brasileiras. Por se tratar de uma indústria jovem, as empresas estão dispostas a experimentar e ter novas ideias. Vocês não são como a Europa de 2000 anos, mantendo um discurso de “este é o jeito que fazemos coisas”. No Brasil, o desafio não é trazer novas ideias, é ter consistência para implementá-las.
 
Quando pensamos em previsão, flexibilidade e foco, acho que as empresas brasileiras desenvolvem mais dos dois primeiros aspectos, mas têm menos foco. Ao contrário das empresas europeias, que têm foco e previsão, mas não são tão flexíveis a tentar coisas novas.
 
Pensando em um nível cultural mais amplo, eu diria que empresas brasileiras têm vontade e habilidade para inovar, é só uma questão de avaliar se elas conseguem executar isto.
 
PM: Como as empresas podem desenvolver esta gestão focada no futuro?
 
GH: Se preparar com sucesso para o futuro envolve reconhecer que você não quer continuar operando do jeito que faz neste momento. Significa se afastar e olhar para além da sua indústria, da sua empresa, do seu país, e procurar novas ideias. É necessário ser criativo em relação ao que você faz, entender por que aquela atividade é feita daquela forma, e se perguntar: esse é mesmo o jeito que deveríamos fazer?
 
É necessário pegar essas novas ideias, focar e executá-las de forma consistente dentro da organização, para garantir que elas sobrevivam no longo termo. Afinal, dar vida a novas ideias nem sempre tem um benefício imediato.
 
PM: E como as empresas podem começar? Qual o primeiro passo?
 
GH: Eu não sei se há uma resposta certa para isso. Mas, se fosse eu, no primeiro dia, eu começaria duvidando de tudo que eu achei que pudesse ser verdade. Questionando tudo que é fato e condensando isso. O que é verdade? O que é inquestionável no meu negócio e sobre meu futuro? Faria isso porque, afinal, muito do que assumirmos serem fatos inquestionáveis são, de fato, só opiniões.
 
PM: Estamos falando de inovação, criatividade… como desenvolver isso?
 
GH: Muitas pessoas pensam que criatividade significa viver fora dos limites da estrutura, e isso é uma mentira. As pessoas mais criativas do mundo vivem dentro de uma estrutura, elas brincam dentro de uma “caixa de areia”. Precisamos ser envolvidos por algum tipo de limite para sermos criativos. E às vezes esse limite pode ser até mesmo uma visão institucional que nos orienta e diz: “é nisso que nos focamos”.
 
Orçamentos, deadlines, visões claras, timelines, tudo isso é importante para inovar. A inovação é mais um processo do que as pessoas acreditam. Inovação é estrutura. Assim como finanças, mineração… O problema é que, de fato, muitas pessoas não percebem que há uma ciência atrás da arte.
 
PM: Estamos falando de futuro e inovação. Em alguns artigos que o senhor divulgou no site da Stratalis, fala sobre inteligência artificial, automação, entre outros tópicos. O senhor acredita ser possível que, um dia, a tecnologia substitua o ser humano?
 
GH: Sejamos muito claros: o conceito de tecnologia substituir humanos é tão antigo quanto o próprio homem. E, ainda assim, de um jeito ou de outro, ainda parecemos ter um propósito. Antes, carregávamos objetos nas mãos; até que alguém inventou a roda. Viajávamos em um barco que requeria centenas de homens para navegá-lo, e agora duas pessoas podem fazer isto. Colhíamos nosso próprio milho, e agora uma máquina faz isso por nós!
 
A tecnologia vai substituir um emprego especifico? Sim, vai. E, provavelmente, desempenhará uma mesma função de uma maneira muito mais segura. Mas isso também implica na criação de novos empregos. Nós, humanos, teremos condições para avançarmos e nos voltarmos para uma economia mais voltada para serviços. Ou teremos a necessidade de ter alguém para consertar essa tecnologia. Ou mesmo alguém para construir nova tecnologia. O desafio sobre a tecnologia substituir humanos significa mudar uma porção da força de trabalho e prepará-la para algo novo.
 
Não há muito que se possa fazer sobre isso, é a realidade de como as coisas funcionam. Mas eu acho que passa a afetar a responsabilidade das empresas, que precisam encontrar um jeito de apoiar e retreinar esses trabalhadores. Também há a responsabilidade dos governos, de ajudar e dar suporte para seu povo em tempos de transição para o futuro. Mas a realidade é, como disse, que as máquinas estão nos substituindo desde o momento que inventamos a roda. Um dia, eu também não terei um emprego como o meu, e terei que encontrar outra coisa para fazer. É assim que funciona.
 
PM: O senhor poderia dar um panorama para a indústria mineradora no Brasil?
 
GH: Sobre o Brasil, só posso dizer uma coisa: eu acho que as oportunidades para o país ser uma fonte de liderança na indústria mineradora são enormes. Isso porque o Brasil é relativamente jovem e aberto a novas ideias. E o que precisamos agora na indústria mineradora é a vontade de ser aberto, de promover engajamento com as comunidades, pensar de forma diferente sobre nossas operações; e acho que o Brasil tem isso.
 
Eu acho que, de forma geral, a indústria mineradora precisa se perguntar: como evitamos os extremos dos ciclos no futuro? O que vai demandar do ponto de vista operacional, organizacional, e nos nossos negócios, para tornar nossa performance mais consistente? Assim, toda vez que o mundo mudar, nós não temos que mudar tanto assim com ele. Isso é importante porque, neste instante, nós estamos sendo escravos de forças que fogem do nosso controle.
 
Da mesma forma que fazemos planejamentos para minas durante décadas, e também para comunidades, também precisamos pensar nos nossos negócios e nas nossas operações desta forma. Devemos pensar para além dos ciclos de forma consistente e em um certo período de tempo. Se fizermos isso, faremos escolhas que podem ser dolorosas hoje, mas que vão levar ao sucesso no futuro.
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